Passarinhos, soltos a voar dispostos

A achar um ninho, nem que seja no peito um do outro

Kalisto estava em um momento contemplativo. Encarava a enorme estrutura metálica à sua frente como quem vê um milagre diante de seus olhos. Sob diversos aspectos, a Ponte Flecha Celeste era mesmo um evento miraculoso. Uma enorme estrutura pesando milhares de toneladas, combinando aço, cimento, plástico e rochas se estendia imponente dezenas de metros acima da água. Só o fato de ela se manter de pé era absurdo; para além disso, conseguir suportar o peso conjunto de centenas de pessoas ao mesmo tempo parecia mesmo algo divino.

Rowen viu uma Policial Jenny de longe, parando sua moto diante de um mural de madeira, fixando um papel e partindo em seguida. Foi até lá para conferir o que era. De vez em quando, a Polícia deixava avisos de criminosos procurados nesses locais, tanto para alertar civis desavisados quanto para manter qualquer policial que passasse por ali atento. Kalisto chegou ao mural e percebeu que não se tratava de um bandido, era mais um aviso sobre cuidado com Pokémon que podiam se perder do ninho. Virou-se na direção da Ponte e percebeu um grupo de Ranger's distribuindo panfletos mais ou menos iguais ao que estava preso no mural.

"Isso deve estar causando uma dor de cabeça danada", pensou, enquanto guardava seu distintivo. Não queria se meter naquele assunto. Nos últimos dias, se pegou pensando diversas vezes sobre a Polícia e o porquê de estar nela. Ele entrara na facção apenas alguns anos antes, mas seus motivos para isso pareciam muito distantes, em um passado quase inalcançável. Claro, tinha conseguido sobreviver bem com o dinheiro que recebia por ser um policial, mas agora, enquanto treinador, tinha outros meios de conseguir lucrar, de forma que a Polícia era apenas mais uma dor de cabeça com a qual ele tinha que lidar.

Passou pelo posto dos Ranger's sem ser notado. Após isso, liberou Mudbray de sua Pokeball e começou a andar com a Pokémon ao seu lado. Kalisto demoraria a admitir, mas estava criando um vínculo de proximidade com ela. Acariciava seu pelo com cuidado e a tipo solo relinchava de alegria com isso.

- Você gosta disso, não é, Mud? - a tipo solo o encarou com estranheza. Era a primeira vez que seu treinador se referia à ela assim, de forma tão amistosa. Ela relinchou e pulou em cima dele, lambendo seu rosto. - Tá, tá, já entendi que você gostou. - falou, enquanto ria.

PRAAAAM

Kalisto e Mudbray pararam imediatamente e olharam na direção do barulho. Parecia que algo metálico tinha caído no chão com força e o eco do barulho ressoava continuamente. Treinador e Pokémon correram na direção do som e não demorou muito para encontrarem a origem dele: um pequeno filhote de Skarmory estava caído, gemendo de dor.

Rowen lembrou-se do cartaz no mural que vira mais cedo. Aproximou-se vagarosamente do Pokémon, desviando de uma bicada aqui e outra ali, até que finalmente conseguiu chegar do lado do tipo voador. Dali em diante, colocou em prática seu conhecimento sobre primeiros socorros: imobilizou sua asa, usou uma Potion para reduzir as dores e saras alguns ferimentos e acalmou o pequeno. Mudbray foi muito útil durante esse processo, conversando com o filhote. Ela realmente era uma excelente Pokémon.

Assim que terminaram os cuidados, o policial pegou Skarmory no colo como quem carrega uma criança. - Vamos te levar pra seu ninho, pequena, não precisa ter medo. - Kalisto achou que a filhote tinha se acalmado, mas ela começou a grasnir e se debater, desesperada.

Mudbray estava distraída com a Pokémon e nem viu o ataque chegando. Um jato de água poderoso atingiu seu flanco, derrubando-a no chão.

Kalisto olhou para cima e percebeu uma ave branca com listras azuis se aproximando rapidamente. A pequena Skarmory se debatia cada vez mais em seu colo e ele percebeu que talvez ela não tivesse caído e sim tivesse sido derrubada. Meio sem jeito, por causa da filhote em suas mãos, apontou sua Pokedex para o Pokémon adversário e o identificou: Wingull. Nesse meio tempo, Mudbray já havia se levantado e parecia muito zangada e pronta para dar o troco.

- Intercepte com Rock Smash. - Assim que o Wingull se aproximou o bastante, Mudbray saltou sobre ele, acertando um ataque com seus casos e derrubando-o no chão. O ataque não causaria grandes danos, mas serviria para colocá-lo em posição desfavorável.


- Acabe com isso com Body Slam - Mudbray correu na direção de Wingull antes que ele conseguisse levantar voo novamente, atropelando-o com todo seu corpo. O pequeno tipo voador caiu desmaiado, fora de combate.


Imediatamente a pequena Skarmory pareceu se acalmar. Kalisto retirou uma Pokeball de sua mochila e arremessou na Wingull. Apesar da distância, conseguiu acertar o tipo voador, que foi rapidamente capturado. Seria uma adição muito útil à equipe.

- Agora vamos te levar para casa.


Kalisto voltou andando para o Posto Ranger no início da ponte. Apresentou-se e entregou a filhote Skarmory aos cuidados dos Ranger's, que conseguiriam devolvê-la para seus pais. A pequena tipo voador grasniu quando ele estava indo embora, o que fez com que ele voltasse para onde ela estava. Ela pegou um pedaço de metal que estava escondido dentro de sua pelagem e entregou para Rowen.

O treinador sorriu para a Pokémon, registrou-a na Pokedex, acariciou sua cabeça uma última vez e voltou a andar pela ponte. Tinha concluído sua boa ação do dia, agora era hora de voltar para seu caminho.

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Ficha: Wingull:

Voar, voar, subir, subir

Ir por onde for

Aquilo parecia uma boa ideia.

Kalisto encarava os Pokémon voadores à sua frente, prontos para batalha, e não conseguia deixar de pensar que aquela era a melhor oportunidade possível para treinar seu Swinub. O tipo gelo estava na sua equipe há alguns dias mas nunca tivera conseguiu participar de nenhuma batalha. Por isso, quando o Spearow e o Emolga apareceram à sua frente, Rowen imediatamente sacou Swinub de sua Pokeball e o colocou em combate. Decidiu que também usaria Mud naquela luta.

- Swinub, temos que tomar a dianteira. Use Ice Shard no Spearow. - O pequeno Swinub formou uma bola de gelo à sua frente e a jogou na direção do tipo voador. A velocidade do golpe foi tanta que Spearow mal conseguiu distinguir o ataque, sendo atingido e arremessado alguns metros pra trás.

Emolga aproveitou a abertura de Swinub para atacá-lo: voou em sua direção rapidamente, com o corpo recoberto de eletricidade e atingiu um ataque frontal contra o pequeno. Entretanto, o rosto do rato elétrico transpareceu sua surpresa. Seu ataque não teve efeito nenhum: Swinub era parte tipo solo, imune aos ataques elétricos.

Nesse ínterim, Spearow recuperou-se do golpe de Swinub e decidiu contra-atacar. Em um voo rasante, cortou a distância entre os dois Pokémon e desferiu um poderoso ataque com o bico no tipo gelo. Peck. O ataque causou danos à Swinub, que teve seu primeiro ferimento de batalha.

- Mud, a Emolga parece que não vai ser problema, então use Body Slam no Spearow - a Pokémon acertou um poderoso ataque no Spearow que estava próximo de Swinub, jogando-o para longe e deixando-o fora de combate. Tinha sido uma batalha fácil até ali.


- Swinub, mantenha o ataque com Ice Shard. - Mais uma vez, o pequeno tipo gelo disparou rapidamente uma bola congelada em seu adversário. Emolga era mais rápido que Spearow e tentou desviar, mas não conseguiu. Imediatamente depois, o voador começou a balançar sua cauda, reduzindo as defesas dos Pokémon de Kalisto com Tail Whip.

- Mud, use Body Slam mais uma vez. - O tipo solo acertou Emolga, arrastando-a com a força do seu corpo e a arremessando contra uma das vigas de sustentação da ponte. Mudbray pareceu ter ficado com eletricidade estática percorrendo seu corpo após o ataque. Kalisto identificou imediatamente o que tinha acontecido: Static.

- Swinub, finalize com mais um Ice Shard. - E com mais um ataque tipo gelo a luta acabou. A pequena Emolga caiu no chão, fora de combate. Uma Cheri Berry que ela segurava rolou até os pés de Rowen.


Kalisto pegou a berry e deu para que Mudbray comesse. Imediatamente, a tipo solo pareceu melhorar dos efeitos negativos da paralisia. Rowen acariciou seus dois Pokémon, Swinub especialmente feliz por ter vencido sua primeira batalha.

O jovem treinador aproveitou que os dois adversários estavam fora de combate para registrá-los em sua Pokedex.

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A treva escura é jogo feito

Um vulto me apavora

Era noite.

Um silêncio incomum e artificial abraçava a Ponte Flecha Celeste. Kalisto caminhava sozinho pelo lugar, olhando para todas as direções em busca de qualquer coisa capaz de romper aquele remanso, mas não havia nada. Os Pokémon pareciam ter sumido, o mar estava parado e mesmo o vento parecia inerte. Além disso, uma bruma estranhamente espessa repousava sobre o lugar. Rowen era uma pessoa corajosa e se orgulhava disso. Durante o seu trabalho como policial enfrentara as piores pessoas e situações possíveis, sem se abalar. Entretanto, naquela ponte, estava amedrontado.

Retirou uma Pokébola da mochila e liberou sua Mudbray. A Pokémon encarou o ambiente com estranheza: esperava ter algum adversário para enfrentar, mas ao invés disso fora convocada para um ambiente inóspito. Olhou para o seu treinador sem entender o que estava acontecendo e Kalisto respondeu às dúvidas de sua Pokémon com um sorriso contido. Acariciou sua crina e disse: - Eu estou precisando de companhia, Mud. - E sob todos os aspectos possíveis aquela era a verdade.

Com Mud ao seu lado, Kalisto pareceu ter sua coragem renovada. Caminhavam em ritmo tranquilo e de vez em quando o treinador acariciava a Pokémon, que retribuía com um relinchar baixo ou com alguns pulos de alegria. A noite não parecia mais tão escura nem tão cheia de horrores.

Até o momento que alguma coisa se mexeu.

Rowen olhou para trás mas não viu nada além de névoa. Entretanto, pôde jurar que vira um vulto em sua visão periférica. Foi algo rápido, que apareceu por menos de 1 segundo e depois sumiu.

Alguma coisa se mexeu de novo.

O treinador virou-se rapidamente para o outro lado - dessa vez, Mudbray também fez o mesmo movimento. Entretanto, não havia nada lá. Não havia nada em lugar nenhum daquela ponte, por isso o silêncio persistia.

Suspirou.

"Deve ser o cansaço", pensou o treinador. E de fato, ele estava exausto: passara o dia todo caminhando pela Ponte Flecha Celeste, sem comer quase nada e com um suprimento limitado de água. Ansiava por chegar logo ao outro lado, mas não achava mais que fosse conseguir naquele dia. Irritado consigo mesmo por sentir um medo irracional, Kalisto virou-se para frente para continuar caminhando. E, de súbito, percebeu que seu medo era completamente racional.

Uma figura imensa aparecia pelas brumas: a sombra de um pássaro enorme de vários metros de envergadura, com asas que pareciam mãos surgiu em sua frente. As pernas de Rowen começaram a tremer e ele quase caiu. Suor frio escorria por todo seu corpo, sua voz falhou. Não podia imaginar que algo tão colossal existisse no mundo real. Ao seu lado, a Mudbray recolheu-se. A Pokémon estava com tanto medo quanto seu treinador.

À medida que a figura se aproximava dos dois ficava ainda maior. De repente, suas asas começaram a se mover para frente, e Kalisto sentiu como se a sua própria morte estivesse tentando abraçá-lo. Mesmo assim, não conseguiu se mexer.

Os braços estavam próximos de Rowen, quase saindo da névoa. O treinador tentou dar alguma ordem para sua Pokémon mas o ar fugiu de seu peito. Fechou os olhos, temendo o que aconteceria.

De repente, o ambiente se encheu com uma risada que não deveria estar ali. Kalisto abriu os olhos e se deparou com um pequeno Pokémon rosa que  flutuava a alguns metros do do chão e "rolava" no ar, se divertindo com toda a situação. O Pokémon parou de rir, olhou para Rowen e falou: "Mew", com um largo sorriso no rosto. Até Mudbray estava se rindo de toda situação.  

- Pelo menos vocês estão se divertindo com isso. - O treinador falou, com um riso sem graça. Os Pokémon apenas acenaram com a cabeça, como se dizendo: "Sim, nós estamos".

Após algum tempo, Mew deu uma volta sorrindo ao redor de Kalisto e de Mudbray e saiu voando, acenando para os dois. Kalisto acenou de volta, e não perdeu a chance de registrar aquele achado único em sua Pokédex. Aparentemente, Mew contém o DNA de todos os Pokémon, então conseguia se transformar neles. "Esse safado deve ter feito isso", concluiu o policial.

Mudbray ainda ria quando ela e Kalisto voltaram a andar pela ponte. Os Pokémon voltaram a fazer barulho, as ondas reiniciaram seu eterno vaivém e o vento tornou a soprar pelo lugar. O silêncio foi preenchido de sons e varrido estrada afora.

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Como é que faz pra sair da ilha?

Pela ponte, pela ponte

Muitas horas haviam se passado desde o encontro com o Pokémon lendário. O Sol já aparecia no horizonte, terminando de dissipar a névoa cada vez mais tênue. De longe, Kalisto conseguia ver o fim da Ponte, o lugar exato onde o metal acabava e a estrada voltava a ser terra de chão. Sentia o cheiro das árvores, ouvia o farfalhar da grama e o zumbido típico de um ambiente recheado de Pokémon insetos.

Caminhou um pouco e leu uma placa que sinalizava que Violet estava a poucos quilômetros. O treinador se sentia agradecido. Passara praticamente as últimas 24 horas andando sem parar, batalhando contra diversos Pokémon e resolvendo problemas que não tinham nada a ver consigo, mas que não paravam de cair em seu colo. Estava exausto e precisava de uma boa noite de sono.

Antes que conseguisse sair da ponte ouviu o gorjeio de um pássaro próximo. Como um vulto, um pequeno Pokémon pássaro cruzou sua visão, parando poucos metros a sua frente o desafiando para uma batalha. Em outras circunstâncias, Kalisto aproveitaria o momento para treinar um dos seus Pokémon novos, mas aquela era uma situação atípica: suas pálpebras pesavam, suas pernas estavam doloridas e ele queria logo chegar no Centro Pokémon da cidade seguinte.

Quase como se lesse sua mente, Mudbray deu um passo à frente, se posicionando para a luta. Entendendo como um aceite ao seu desafio, Spearow voou rapidamente na direção de seu adversário, cortando o ar com um bater de asas frenético. Seu Peck acertou a testa de Mudbray, que sequer se mexeu. A Pokémon não precisou nem ouvir qualquer ordem de seu treinador: acelerou o galope e desferiu um Body Slam em Spearow, com uma indiferença brutal, como se ele nem estivesse ali.


Antes que pudesse se dar conta do que aconteceu, Spearow caiu desmaiado, fora de combate. Dali a algumas horas acordaria com a sensação de que tinha sido atropelado por um trem de carga, algo completamente plausível dada a diferença de peso entre os dois Pokémon. Kalisto recolheu uma pena derrubada pelo Spearow adversário - ele já tinha ouvido falar que itens como aquele poderiam ser usados para fortalecer algum aspecto dos Pokémon.

Suspirou aliviado, permitindo-se aproveitar seu primeiro momento de genuína tranquilidade desde que subira na Ponte Flecha Celeste. Estava tudo bem, apesar de tudo. A cidade de Violet o esperava.

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